2 de junho de 2012

Intertextualidade

Intertextualidade

Alguns textos dialogam entre si, influenciando a linguagem um dos outros. A essa "conversa" entre textos dá-se o nome de INTERTEXTUALIDADE. Às vezes, o uso ou troca de ideias entre os textos visa a reforçar um pensamento, ampliar, parodiar, criticar, ou mesmo, opor-se a uma ideia anterior.

Leia os textos a seguir, e observe como alguns autores compõem sua mensagem a partir de textos elaborados por outros autores.

Dois Anjos. Raphael Sanzio.

TEXTO I
Poema de sete faces

"Quando eu nasci, um anjo torto
Desses que vivem na sombra
Disse: vai Carlos! Ser gauche na Vida."
[...]
CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE, in Algumas poesias. Rio de janeiro: Aguilar, 1964. (Fragmento)

TEXTO II
Até o fim

"Quando eu nasci veio um anjo safado
O chato dum querubim
E decretou que eu estava predestinado
A ser errado assim
Já de saída a minha estrada entortou
Mas vou até o fim."
[...]
CHICO BUARQUE. Letra e música. São Paulo: Cia. das Letras, 1989. (fragmento).

TEXTO III
Com licença poética

"Quando nasci um anjo esbelto,
Desses que tocam trombeta, anunciou: 
Vai carregar bandeira.
Cargo muito pesado pra mulher
Esta espécie ainda envergonhada."
[...]
ADÉLIA PRADO. Bagagem. Rio de Janeiro: Guanabara, 1986. (fragmento).

Você observou que, a partir do texto do poeta Carlos Drummond de Andrade, Chico Buarque e Adélia Prado estabeleceram uma intertextualidade, e assim criam novos textos que "dialogam" com o Poema de sete faces.
No texto de Drummond, um anjo torto parece amaldiçoar o destino do eu lírico: ele vai ser gauche, andar errado, ser torto como o próprio anjo. O anjo de Chico Buarque também decreta que o eu lírico será errado, mas o eu lírico brinca com o anjo. Chama-o de safado, de chato e afirma: vai até o fim. Chico Buarque parece mostrar que é possível ser gauche e estar de bem com a vida.
Em Adélia Prado, a intertextualidade está explícita logo no título: Com licença poética. O seu anjo é esbelto; não é torto, não é gauche. Exibe-se, toca trombeta e, no lugar de uma maldição, anuncia sua tarefa: "Vai carregar bandeira". O eu lírico contesta que ser coxo (gauche) possa ser considerado maldição para uma mulher. Assim, tanto Chico Buarque quanto Adélia Prado traçam novas possibilidades de destino para seu eu lírico.

Sarmento, Leila Lauar. Português: leitura, produção, gramática. - 2.ed. - São Paulo: Moderna, 2006, p. 270-271.