20 de junho de 2012

Figuras de Linguagem



A linguagem poética explora o sentido conotativo das palavras, recriando, alterando e enfatizando o significado institucionalizado delas. Incidindo sobre a área da conotação, as figuras dividem-se em:
1) figuras de construção (ou de sintaxe) têm esse nome porque interferem na estrutura gramatical da frase;
2) figuras de palavras (ou tropos) constituem-se de figuras que adquirem novo significado num contexto específico;
3) figuras de pensamento, que realçam o significado das palavras ou expressões.

Figuras de Construção (ou sintaxe)
Elipse: omissão de um termo facilmente identificável. O principal efeito é a concisão:

"No fim da festa, garrafas e copos espalhados pelo chão."

Verifique que, nessa frase, houve a elipse do  verbo haver, que pode ser facilmente percebido pelo contexto: No fim da festa, havia garrafas e copos espalhados pelo chão.

Zeugma: é um tipo de elipse que consiste na omissão de uma ou mais palavras já mencionadas anteriormente.

"O dia estava frio; o vento, cortante."

Omitiu-se a forma verbal estava: O dia estava frio; o vento estava cortante.
A palavra omitida pode ser um verbo anteriormente citado, só que em outra flexão. Veja outro exemplo: 

"Como teus olhos são claros
e a tua pele, morena"


No segundo verso, omitiu-se o verbo ser, mas sob a forma é (e a tua pele é morena).

Pleonasmo: repetição de um termo ou ideia. O efeito é o reforço da expressão.

"O acidente foi horrível e o homem viu tudo com seus próprios olhos."

É claro que alguém só pode ver com seus próprios olhos, mas essa expressão redundante ou repetitiva tem a função de destacar a expressão dessa ideia.

Outros exemplos:

"Rolou de escada abaixo."
"Resta-me a mim somente uma esperança."
Atenção!
Devem ser evitados os pleonasmos viciosos, que nada acrescentam à frase, tais como: subir para cima, sair para fora, descer para baixo, enfrentar de frente etc.

Polissíndeto: consiste na repetição de um conectivo, geralmente a conjunção e, sugerindo uma sequência rápida e, contínua de ações.

"E foge, e volta, e vacila e treme, e canta."
"Feliz, os torcedores do time campeão saíram às ruas, e cantaram, e dançaram, e festejaram até a noite chegar."


Assíndeto (ausência de conjunção): é a figura oposta ao polissíndeto.

"Não sopra o vento, não gemem as vagas, não murmuram os rios."

Iteração ou repetição: consiste na repetição de um termo. Difere do polissíndeto por ser a reiteração de qualquer palavra e não só da conjunção.

"O surdo pede que repitam, que repitam a última frase"
Cecília Meireles

Aliteração: consiste na repetição de um som consonantal para sugerir um objeto ou a ideia desse objeto.
Observe, nestes versos de Cruz e Souza, o efeito sonoro conseguido pelo poeta com a aliteração do fonema /v/ - nos três primeiros versos e do fonema /t/ no último verso:

"Ó vellho vento saudoso,
velho vento compassivo,
ó ser vulcânico e vivo
taciturno e tormentoso"

 
Onomatopeia: Consiste na imitação de um som.

"O tique-taque do relógio me deixava irritada."
" zunzum feito por parte da plateia incomodou o pianista."
"De repente - bum! - ouviu-se uma explosão no pátio."



Anacoluto: é a interrupção do esquema sintático inicial da oração, que termina por outro, diferente.

"Meu pai, não admito que falem dele."



Silepse: ocorre quando a concordância de gênero, número ou pessoa é feita com ideias ou termos subentendidos na frase. A silepse pode ser:

a) de gênero:

"O ministro se dirigiu ao rei e perguntou:
- Vossa Majestade está muito preocupado?"

Observe que o adjetivo está no masculino, concordando não com o pronome Vossa Majestade, que tem forma feminina, mas com a pessoa a que se refere esse pronome, que é um homem.

b) de número:

O povo lhe pediram que cedesse. (pediram não concorda com povo, mas com a ideia de coletivo, de plural presente em povo)

A turma ficou apavorada e fugiram. (o verbo na 3ª pessoa do plural, concordando não com a palavra turma, que está no singular, mas com  a ideia de plural que esse substantivo sugere).

c) de pessoa:

"Os brasileiros gostamos de futebol."
O sujeito brasileiros levaria normalmente o verbo para a 3ª pessoa do plural (eles); nessa frase, porém, a concordância foi feita com a 1ª pessoa do plural (nós), indicando que a pessoa que fala também se inclui entre os brasileiros.


Figuras de Palavras (ou tropos)

As figuras de palavras baseiam-se no emprego simbólico, figurado, de uma palavra por outra, quer por contiguidade (relação de proximidade), quer por similaridade (associação, comparação).

Metáfora: fundamenta-se numa relação subjetiva, ela consiste na transferência de um termo para outro âmbito de significação que não é o seu e para isso parte de uma associação afetiva, subjetiva entre dois universos. É uma espécie de comparação abreviada, à qual faltam elementos conectores (como, assim como, que nem, tal qual etc.)

"Meu verso é sangue." Manuel Bandeira
Observe que, ao associar verso a sangue, o poeta estabelece uma relação entre as duas palavras, vendo nelas alguns pontos em comum. Todos os significados sugeridos pela palavra sangue passam também para a palavra verso.
Repare que a associação de ideias contida numa metáfora é bem subjetiva, por isso, em certos casos, é muito fácil "explicar" o significado de uma metáfora. Podemos fazer algumas interpretações, mas sem a pretensão de querer exatamente o que ela significa.
Os poetas são mestres na criação de metáforas surpreendentes, ricas em significados e sugestões. Veja outro exemplo neste verso de castro Alves:

"O campo é o ninho do poeta..."

Costuma-se distinguir a metáfora pura da metáfora impura (símile), aquela em que os dois termos da comparação vêm expressos.

"A noite é um manto negro sobre o mundo." (noite e manto negro são os dois termos da comparação)

Metáfora impura é aquela em que não está presente em nenhum termo da comparação.

"O manto negro desceu sobre o mundo."

Esquematizando:
Essa mulher é perigosa tal qual uma cascavel = comparação
Essa mulher é uma cascavel = metáfora impura
Convivo com uma cascavel = metáfora pura.

Metonímia: consiste na substituição de um nome por outro porque entre eles existe alguma relação de proximidade. Essa relação de substituição surge quando se emprega:

a) a parte pelo todo (ou vice-versa):

Estava novamente sem teto (teto = casa).
b) o gênero pela espécie (ou vice-versa).
Os mortais são covardes (mortais = homens).
c) O singular pelo plural (ou vice-versa).
O francês gosta de um bom vinho (francês = franceses).
d) a matéria pelo objeto:
Colocou seus cristais à venda (cristais = copos ou objetos de cristais)

Obs.:  Os casos acima exemplificados são denominados por alguns autores como sinédoque. Modernamente a metonímia engloba a sinédoque.

e) o autor pela obra:
"Devolva o Neruda que você me tomou e nunca leu..." (Chico Buarque)
(Neruda = livro de poesias de Pablo Neruda)
f)  a causa pelo efeito (ou vice-versa):
"Comerás o pão com o suor de teu rosto." (suor = efeito da causa que é o trabalho, isto é, "Comerás a comida com fruto do teu trabalho"). Temos aqui, também a parte pelo todo: pão designa o alimento em geral.
g) o continente pelo conteúdo (ou vice-versa):
Tomou duas latas de cerveja (lata = a cerveja contida na lata).
h) o instrumento pela pessoa que o utiliza:
Ele é um bom garfo (garfo = glutão, guloso, homem que come muito).
i) o lugar pelo produto:
O presidenciável gosta de um bom havana (havana = charuto fabricado em Havana, capital de Cuba).
j) o concreto pelo abstrato (ou vice-versa):
A junvetude brasileira está desorientada (juventude = as pessoas jovens).
k) o sinal pela coisa significada:
O trono estava abalado (trono = império, reino)

Catacrese: ocorre quando transferimos a uma palavra o sentido próprio de outra. Se a metáfora surpreende pela originalidade na associação de ideias, o mesmo não acontece com a catacrese, que, por ser constantemente repetida, já não chama a nossa atenção. Exemplo:

"Ele embarcou no trem das onze."

Observe que o verbo embarcar pressupõe barco e não trem. Mas essa forma de dizer já está tão incorporada na língua que nem percebemos que se trata de linguagem figurada. O mesmo ocorre com expressões como perna de mesa, folha de papel, braço da cadeira, asa da xícara, coração da cidade, enterrar uma faca no peito etc.

Antonomásia: consiste na substituição de um nome por outro ou por uma expressão (perífrase) que facilmente o identifique.

A Cidade Maravilhosa, depois das chacinas e dos arrastões, já está sendo chamada de Cidade Perigosa. (Cidade Maravilhosa e Cidade Perigosa = Rio de janeiro)

Figuras de Pensamento

Antítese: é a figura que evidencia a oposição entre ideias.
"Fez-se do amigo próximo o distante." Vinicius de Moraes
"Morre! Tu viverás nas estradas que abriste!" Olavo Bilac

Hipérbole: ocorre hipérbole quando, para realçar uma ideia, exageramos na sua representação.

"Estou morrendo de sede! Vou beber alguma coisa."
"Chorou um rio de lágrimas."
"Toda vida se tece de mil mortes."
"Um oceano de cabeças ondulava à sua frente."

Eufemismo: consiste no abrandamento de expressões cruas e desagradáveis. Dito de outro modo, empregamos quando desejamos atenuar ou suavizar a expressão de uma ideia desagradável ou chocante.

"Foi cometido pelo mal de Hansen." (= contraiu lepra)
"O hábil político tomou emprestado dinheiro dos cofres públicos e esqueceu-se de devolver." (= o hábil político roubou dinheiro público)

Ironia: consiste em sugerir, pela entonação e contexto, o contrário do que as palavras ou as frases exprimem, por intenção sarcástica.

Que belo negócio! (= que péssimo negócio!)
O rapaz tem a sutileza de um elefante.

Personificação (prosopopeia): consiste em atribuir atitudes ou características humanas a coisas ou a seres irracionais. A personificação é muito usada nas fábulas, que apresentam animais comportando-se como seres humanos.

"O inútil choro das tristes águas
Enche de mágoas a solidão..." Vicente de Carvalho

"Viram um leão e um homem. No caminho, encontraram uma estátua de pedra que mostrava um homem estrangulando um leão. 
O homem disse ao leão:
- Vês como somos mais fortes que vocês?
E este, sorrindo, respondeu:
- Se os leões soubessem esculpir, verias o leão estrangulando o homem..." Fábulas de Esopo

Veja o vídeo e confira!
Referência bibliográfica: OLIVEIRA, Ana Tereza Pinto de. Minimanual compacto de redação e estilo: teoria e prática. - São Paulo: Rideel, 1999, p.167 a 175. TUFANO, Douglas. Gramática fundamental. - 1.ed. - São paulo: Moderna, 2007, p. 112 a 135.